O quadro global, com números consistentes
- Parceiro íntimo (global): estudos estimam que ≈38–40% dos homicídios de mulheres são cometidos por parceiros íntimos. Para homens, a estimativa gira em torno de ~6%.
- Parceiro íntimo + família (global): cerca de 60% das mortes de mulheres ocorrem no círculo parceiro/familiar. Em 2023, a ONU estimou ~51,1 mil mulheres e meninas mortas por parceiro ou familiar (≈140/dia) de um total de ≈85 mil mulheres/meninas mortas intencionalmente.
- Contexto geral: embora homens sejam ≈80–81% das vítimas de homicídio no total, no recorte de parceiro íntimo a maioria das vítimas passa a ser mulher. O “lar” segue como o local de maior risco para elas nesse tipo de crime.
Atenção: os percentuais 38–40% (mulheres) e ~6% (homens) são globais e descrevem proporções (risco relativo dentro do total de homicídios por sexo) — não dizem, por si, “quem morre mais em números absolutos” em um país específico.
O que dá para afirmar com segurança no Brasil
- Feminicídios em alta histórica: o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2025) reporta 1.492 feminicídios em 2024, o maior número da série (desde 2015).
- Base robusta para mulheres: há dados nacionais padronizados para feminicídio (registros policiais, tipificação legal).
- Base fraca para homens: para “homens mortos por parceiras íntimas”, não existe série nacional padronizada e anual equivalente.
Conclusão técnica: no Brasil, afirmar “quem é maioria em números absolutos de vítimas em relações íntimas” não é possível com evidência simétrica — faltam dados padronizados para o lado masculino.
Onde nascem as confusões (e como evitá-las)
1) Misturar global com nacional
Usar percentuais globais (38–40% vs. ~6%) para tirar conclusões sobre o Brasil gera erro de escopo.
2) Proporção ≠ contagem absoluta
“40% das mulheres mortas por parceiro” fala de risco relativo dentro do total de homicídios femininos. Não responde, sozinho, “quem morre mais em números absolutos no Brasil”.
3) Supor simetria que não existe
Feminicídio tem etiqueta nacional; “homem morto por parceira íntima”, não. Sem simetria, qualquer ranking absoluto fica metodologicamente frágil.
A lacuna para homens no Brasil (e por que isso importa)
É legítima a crítica: o país não coleta/divulga de forma padronizada uma série nacional de homicídios de homens por parceiras íntimas. Consequências:
- Diagnóstico incompleto: dificulta entender o fenômeno como um todo.
- Políticas menos precisas: prevenção e proteção ficam assimétricas.
- Debate público pior: abre espaço para “placares” baseados em suposições.
O que cobrar do Estado: marcar para todos os homicídios o vínculo vítima–autor (parceiro, ex, familiar, conhecido etc.), com publicação aberta (planilhas e microdados).
O que é seguro escrever (sem enviesar)
- Global: a maioria das vítimas de homicídio por parceiro íntimo é mulher; em 2023, foram ≈51,1 mil mulheres/meninas mortas por parceiro ou familiar (≈60% do total de mulheres mortas intencionalmente).
- Brasil: feminicídios atingiram 1.492 em 2024 (recorde). Não há série espelhada para “homens mortos por parceiras”, logo a comparação absoluta é inconclusiva.
Nota metodológica
Este texto distingue proporção (risco relativo dentro do conjunto de homicídios de cada sexo) de contagem absoluta (número de vítimas por ano).
Percentuais globais (≈38–40% mulheres; ~6% homens) não podem ser aplicados automaticamente ao Brasil.
Para comparações nacionais entre sexos no contexto de parceiro íntimo, é necessário que o país publique série simétrica por sexo + vínculo vítima–autor.
Fontes e links
- UN Women / UNODC — estimativas globais (parceiro íntimo/família), “uma mulher morta a cada ~10 minutos”, 2023 ≈ 51,1 mil por parceiro/família; ≈60% do total.
- UNODC – Global Study on Homicide — percentuais globais (≈38–40% mulheres por parceiro íntimo; ~6% homens), distribuição 81%/19% de vítimas no total.
- Fórum Brasileiro de Segurança Pública — 19º Anuário (2025) — 1.492 feminicídios em 2024 (recorde) e demais indicadores nacionais.
- Ipea/FBSP – Atlas da Violência — séries e notas metodológicas sobre limitações de registro e comparabilidade.






